sexta-feira, 2 de abril de 2021

Maverick com motor de GT40 e fora do Regulamento?




Voltamos à 1973, o ano do lançamento do Maverick no Brasil e de sua estreia nas corridas. 
Enquanto nas ruas havia filas de espera para comprar o bólido, nas pistas ele juntava amantes e rivais. 
Sua primeira corrida no Brasil foi apenas 66 dias após o seu lançamento e o resultado foi a vitória. Assim aconteceu também nas outras 3 corridas seguintes, o carro novo, desconhecido e pode se dizer, uma incógnita, venceu todos os adversários que tinham vasta experiência e rodagem pelas pistas brasileiras. É claro que não podemos deixar de falar dos pilotos que sempre corajosos davam o máximo para alcançar a vitória. Nunca foi fácil, estava repleto de gente competente do lado do Maverick e do lado dos seus adversários.
Quando venceu a primeira vez, houve muita falação, acusações de irregularidades e de estar fora do regulamento, mas no final das contas ninguém provou nada e todos esqueceram, porém ali nascia uma grande disputa, pois quem estava acostumado a vencer, agora tinha um rival muito forte para encarar. Em uma das revistas de maior circulação na época, o Maverick não recebeu os méritos como deveria, as manchetes sempre desviavam o foco para outro ponto (1) (2) (3), mas ele seguiu vencendo.

As 4 primeiras corridas foram disputadas dentro das regras da Divisão 1, onde os carros corriam quase que originais, sem nenhuma modificação no trem de força.

A 5ª corrida que o Maverick disputou foi a última de 1973, as Mil Milhas brasileiras. Ela é até hoje a mais charmosa e importante do automobilismo de turismo nacional. Os pilotos vencedores tornam-se heróis e os carros, inesquecíveis.

Placar Magazine 21.12.7


Naquele ano em específico, apenas carros nacionais poderiam correr e o regulamento estava sob as regras da Divisão 3, onde a preparação era praticamente livre e o motor poderia ser envenenado, mas deveria ser o original do carro.

Para uma visão mais completa sobre as corridas de 1973, clique aqui.

Vamos continuar a história do ponto de vista do Maverick vencedor dessa corrida, o carro da Dropgal-Ford, equipe da Ford comandada pelo fantástico Luiz Antonio Greco.
Este carro venceu a 1ª – 25 Horas de Interlagos, a 2ª – 500KM de Interlagos, ficou em segundo lugar na 3ª e não disputou a 4ª talvez para se preparar com tempo para sua grande transformação em Divisão 3.

Folha de S Paulo 19.12.73

E até então estava tudo normal, não havia nenhum questionamento sobre regulamento. Este Maverick venceu as Mil Milhas sendo pilotado pelos irmãos Clemente, Nilson e Bird e chegou com 4 voltas na frente do 2º colocado, outro Maverick que chegou 2 voltas na frente do 3º colocado.


Quatro Rodas 1.74

OK, mas para deixar ainda mais explicado, vamos ver qual era o motor original do Maverick:

Acervo AutoMotor

Certo? O Maverick usa um motor 302 V8.

Muito bem, a vida seguiu, a equipe Ford passou a se chamar Mercantil-Finasa-Ford, os carros foram pintados, novos pilotos chegaram, mais corridas vencidas com a mesma preparação e tal.

Passado essa época, algumas pessoas começaram a dizer que este Maverick estava irregular, que o motor que tinha usado não era dele. Alguns dizem que era do Ford GT40, outros dizem que era outro bloco Ford... Sabe aqueles casos de teoria da conspiração? Pois é, o Maverick não escapou disso.
Não há uma argumentação forte e convincente de quem acredita em uma troca de motor, mas você sabe que aqui no blog nós mostramos fatos e o contexto da história. Então vamos lá.

É até uma vergonha ter que “defender” este carro, pois não é a maioria que o ataca, alguns é dizem que ele estava fora do regulamento, mas como não sabemos o tamanho do estrago (quantas pessoas podem ter sido enganadas), apresento à todos os interessados os fatos desse caso.

 Dizem:

“Era o motor do Ford GT40”

Ok, mas qual era o motor do GT40? Não existia apenas um disponível. E de qual GT40 estamos falando? Aqui já vemos a fragilidade da acusação.
Acontece que havia apenas 1 Ford GT40 no Brasil e quando esse carro chegou aqui em 1969, ele tinha o motor 289 V8. (4,7 litros)

 

Correio da Manhã 28.10.69 

Aqui neste link há mais detalhes sobre o GT40.

Não é pela questão de números, mas sabemos que o 302 é a evolução do 289. Será que fariam essa troca?

Em junho de 73, o Ford GT40 havia recebido um 302 V8 para se adequar à nova regulamentação da CBA, mas já pertencia a outra equipe.

 

Correio Brazilliense 25.6.73

Agora veja, mesmo que a outra equipe desmontasse o seu carro para emprestar o motor a outro competidor; não estaria fora do regulamento pois trata-se de um motor 302. Lembrando que a corrida aconteceu em dezembro de 73.
Será então que importariam um motor para o Maverick vencer aqui no Brasil? Qual motor seria? O 289 era “inferior”, o 302 era igual, o 351 é enorme, o 427 nem pensar...
E eles teriam todo esse trabalho para que? E ainda correr o risco de serem desclassificados vergonhosamente? 
Um Maverick havia vencido 4/4 corridas, não seria necessário tanto esforço para vencer mais essa. Concordam? 

Dos motores que citei apenas o 289 e o 302 possuem maior semelhança externa, mas para o outros, a diferença do 302 é gritante. Não precisa abrir pra saber, basta olhar por fora que fica fácil de distingui-los.

Vejamos o que foi dito sobre a preparação desse carro na época:

Jornal do Comercio 23.12.73

 "O motor desse carro é o Ford V8 normal do Maverick vendido ao público"

 

Placar Magazine 21.12.73

"...foi perfeita a ligeira mexida no motor para render mais do que nas provas de Divisão 1....". "... na parte de baixo do motor tudo ficou como original..."

 

Luta Democrática 24.12.73

"... correu com o mesmo motor V8 de 5 litros do carro vendido ao público..."

  

Ficha Técnica:

Motor V8 302
Cabeçotes Gurney
Comando de válvulas especial
4 carburadores duplos Webber 48 IDA
Suspensão rebaixada, com molas e amortecedores mais rígidos
Freio a disco ventilado nas 4 rodas
Rodas de magnésio de 10 polegadas
Peso reduzido pela eliminação de todo o revestimento interno e de equipamentos dispensáveis para corrida
Substituição dos vidros laterais e traseiro por chapas transparentes de plexiglass
Remoção dos parachoques e alargamento dos paralamas
Pneus para corrida de longa duração importados

Não é absurdo dizer que a potência dele estava na casa dos 400 cavalos.

Exatamente, Luiz Antonio Greco muito à frente de seu tempo, foi atrás da preparação adequada para o Maverick e trouxe dos EUA os cabeçotes Gurney, os carburadores Weber e colocou tudo no lugar. O serviço ficou a cargo de um dos maiores mecânicos que este país já viu, o mestre Mariano, fiel escudeiro do Greco.

O Greco era tão avançado que enquanto o pessoal focava em motor e potência, ele também investiu em pneus. Dos 4 pneus que começaram a corrida, 3 foram até o final, apenas 1 furou. Seus adversários tinham que parar frequentemente para trocar seus pneus, pois eram pouco duráveis...

Ah como eu queria ter conhecido o gênio Greco...

E assim aconteceu. É por isso que não houve contestação na época. Ninguém questionou o motor, a preparação, nada e olha que oportunidade de um registro desse não faltou pois jornais e revistas relataram briga entre jornalistas e policiais, incêndios, intoxicação pela fumaça dos carros, uso de gasolina “proibida”, procura por cachorro quente... Mas não há uma palavra sequer sobre carro fora do regulamento.

O Maverick venceu com o seu próprio motor como o regulamento manda.

É uma pena que para sustentarem seus pontos de vista, distorceram até mesmo o relato dessa história contada pelo Bird Clemente em seu livro. O Bird era um dos pilotos do Maverick e teve grande participação em todo esse trabalho com a equipe formada pelo Greco.

A trajetória do Maverick foi marcada por muitas conquistas, mas também sempre foi atacada por descrentes e por mal informados.

O Maverick nunca foi apenas um motor ou um carro avulso. Ele era um produto Ford que no universo das competições já havia provado de tudo.
Talvez seja isso que não entendam, mas não tinha e realmente não teve como superar o Maverick nas corridas. A bagagem e o legado que o sustentam são enormes.

Agora veja, o Maverick sempre usou motor de GT40 desde o início? Podemos dizer que sim, pois o 302 V8 era de série tanto no carro médio esportivo da Ford no Brasil, quanto no bicampeão das 24 Horas de Le Mans (68 e 69) e outras corridas mais.  (veja a ficha técnica aqui

 


Bom, aqui vimos o contexto, vimos as notícias de época e com total coerência rebatemos o que dizem. Sempre falo que ninguém precisa acreditar em mim, pois são os jornais e revistas que contam a história. Antes de escrever, também consultei o Fábio Greco, filho do Luiz Antonio Greco. O Fabio é um cara incrível e bastante receptivo. Ele disse que já nem perde mais tempo discutindo esse assunto justamente porque essas acusações não fazem sentido algum.

Enfim, a você interessado pelo que aconteceu de fato, fica aqui a contribuição do Blog Maverick na História para que a verdade não seja sufocada por desinformação. Dá pra falar muito mais coisa sobre esse assunto, mas precisa?

Até hoje quando um Maverick está na frente em uma competição, o primeiro comentário que vemos é: “De Maverick só tem a carcaça, o resto foi todo modificado”, mas quem diz isso nunca vai apurar os fatos e então a mentira vai se tornando comum até o ponto que quem ouve aceita como verdade... Não fazem ideia de como as equipes trabalham exaustivamente para tirar o máximo de desempenho com poucos ajustes.

São tempos difíceis para falar de assuntos com embasamento confiável...

Nilson, Bird e a Miss Bardahl


Ford abraço!


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2 comentários:

  1. Meu Deus , QUE matéria.. chorei tanto.. até a saudades .. até a lembranças.. papai trazia estas peças enrolados em cashmere ballantines.. minha mãe queria matar ele.. do valor que estas peças tinha pra ele.. vivi o outro lado.. digo: que ele morreu cedo, pois eu via meu pai nascer e morrer em cada corrida. Grata por este momento .. amei

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    Respostas
    1. Querida Ornella! Fico feliz que tenha gostado. Eu queria muito ter vivido essa época. Obrigado por comentar. Beijo!

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